Setor provoca debates urgentes, tem expansão desde 2018 e espaço para crescimento
Guilherme Soares Dias*
“Desafios para a valorização da herança africana no Brasil” foi o tema do Enem 2024, o principal exame para a entrada nas universidades brasileiras. Assunto urgente, importante e que ganhou espaço nos debates sociais. Esse também é o mote do afroturismo, vertente de viagens focada em história e cultura negra, que já é realidade no Brasil, se configura como uma nova tendência do turismo e é oportunidade de mais diversidade no setor e de novos negócios.
A atuação de empresas chefiadas por pessoas negras e o surgimento de novos roteiros afrocentrados têm pautado não apenas as operadoras de turismo, mas os eventos do setor, os governos (provocados a criar novas políticas públicas) e despertado o desejo dos turistas de viverem novas experiências, mais conectadas com sua história, que não foi tradicionalmente contada pela escola, mídia e tampouco pelo turismo.
Já é possível dizer que a consolidação do afroturismo tem ampliado o cenário dos eventos, terminologias e o debate sobre diversidade, em um setor até então embranquecido.
Enquanto o coletivo de empresários e guias estabelecem conversas para a criação de uma Associação Brasileira do Afroturismo, a Embratur, que promove o destino Brasil no exterior, incentiva e prioriza a divulgação de destinos ligados à cultura e história negra em seus eventos externos.
Políticas
O Plano Nacional de Turismo (PNT) 2024-2027, lançado pelo Ministério do Turismo, neste ano inclui o afroturismo como uma das tendências. Há ações também do Ministério da Igualdade Racial (MIR) com o Rotas Negras, que tem por finalidade fomentar o turismo voltado à cultura afro-brasileira. O Programa será estruturado por ações de incentivo a rotas de turismo focados na história negra, consideradas pelo órgão fundamentais para o enfrentamento do racismo no País.
Já o Ministério dos Direitos Humanos realiza o projeto “Sinalização e Reconhecimento de Lugares de Memória dos Africanos Escravizados no Brasil” que pretende sinalizar 100 locais de 16 Unidades da Federação em que coloca placas com o objetivo dar visibilidade à história da matriz africana no país.
As políticas do governo federal vão se espelhando em estados como São Paulo, que lançou o guia de afroturismo, e cidades como Salvador, que executou o Salvador Capital Afro, e São Luís, que inaugurou monumento à diáspora africana, placas de lugares de cultura e história negra e realiza eventos específico para o setor, além da promoção do destino.
Empresas
No setor privado, é importante lembrar que há aumento da procura por destinos ligados à cultura e história negra, além do crescimento de empresas do setor desde 2018. A população negra representa 56% e consome cerca de R$ 1,7 trilhão por ano, ou seja, somente os brasileiros de cor preta e parda seriam o 17º país em consumo no mundo.
Além disso, é importante lembrar que o afroturismo pode e deve ser praticado por pessoas de todas as cores e etnias, sendo uma oportunidade de expansão de negócios, oferta e experiências para as empresas. Quem ainda não investe está perdendo dinheiro e espaço nesse mercado.
Os diferentes atores da cadeia do turismo têm entendido que o Brasil precisa se vender como um destino para além de sol/mar/natureza e de que não dá para falar de cultura brasileira, sem falar de cultura negra. Esse é o grande diferencial e o que torna o nosso país um lugar único, rico e pulsante. Ou seja, todas as estradas nos fazem olhar para o afroturismo, um caminho de volta à nossa ancestralidade e que aponta o futuro, como a adinkra (símbolo africano) do pássaro sankofa. Assim seguimos em frente, sem jamais esquecer nosso passado.
*É jornalista, fundador do Guia Negro, consultor em diversidade e viajante